O estaleiro

A manhã nasceu finalmente luminosa e límpida, o caminho é pela ponte e o sol reverbera no leito do nosso rio, mar interior da minha cidade inevitável, conduzo a custo para o estaleiro, lá fazem aquela magia de me remendar, como uma recauchutagem de um pneu ou um conserto na chapa, o problema permanece e persiste lá, mas a aparência geral fica muito melhor e aguenta mais uns Km. Sei que isto é um processo em que a paciência e a perseverança são as chaves da minha sobrevivência, sei que não posso desistir, apesar de essa ser a minha vontade, reconheço que o importante não é chegar, mas conseguir ser feliz a percorrer o caminho.

A esperança, essa grande filha dos sonhos

Na verdade, sonhos não é bem a palavra que me ocorre à mente quando penso nisso. Se me dessem uma nota de 500 por cada vez que o meu coração se encheu e rejubilou na esperança da concretização de um sonho, apenas para depois se esvaziar como um balão que alguém desistiu de encher, estaria certamente multimilionária. Dentro de mim vive agora apenas a frustração, uma deformação gigante e obesa, um monte de destroços e caos, uma alegoria em pontas de uma ária muito triste em violino e contrabaixo, uma deserção da alegria e das coisas belas e puras e um grito, um grito que se sufoca e morde para não sair. Desconheço o sentido da vida, falho em todos os caminhos que sigo e agora quedo-me paralisada sob o peso de todas as dores que fui acumulando e aceitando. O limite está aqui, à beira deste precipício que sou eu mesma nesta vida inóspita e violenta.