Não vamos casar !

Detesto casamentos. Detesto particularmente casamentos de Verão. Detesto as filas de carros a buzinar com merdinhas brancas penduradas nas antenas. Detesto a hipocrisia do casamento, do dia, do contrato e da instituição. Se também detestas algumas destas coisas junta-te ao club

terça-feira, março 21, 2006

Sobre o Desassossego (em capítulos do livro do mesmo)

"113.
Dois, Três dias de semelhança de princípio de amor...
Tudo isto vale para o esteta pelas sensações que lhe causa. Avançar seria entrar no domínio onde começa o ciúme, o sofrimento, a excitação. Nesta antecÂmara da emoção há toda a suavidade do amor sem a sua profundeza - um gozo leve, portanto, aroma vago de desejos; se com isso se perde a grandeza que há na tragédia do amor, repare-se que, para o esteta, as tragédias são coisas interessantes de observar, mas incómodas de sofrer. O próprio cultivo da imaginação é prejudicado pelo da vida. Reina quem não está entre os vulgares.
Afinal, isto bem me contentaria se eu conseguisse persuadir-me que esta teoria não é o que é, um complexo barulho que faço aos ouvidos da minha inteligência, quase para ela não perceber que, no fundo, não há senão a minha timidez, a minha incompetência para a vida.

116.
Escrever é esquecer. A literatura é a maneira mais agradável de ignorar a vida. A música embala, as artes visuais animam, as artes vivas ( como a dança e o representar) entretretêm. A primeira, porém, afasta-se da vida por fazer dela um sono; as segundas, contudo, não se afastam da vida - umas porque usam fórmulas visíveis e portanto vitais, outras porque vivem da mesma vida humana.
Não é esse o caso da literatura. Essa simula a vida. Um romance é uma história do que nunca foi e um drama é um romance dado sem narrativa. Um poema é uma expressão de ideias ou de sentimentos em linguagem que ninguém emprega, pois ninguém fala em verso."

Bernardo Soares, O Livro do desassossego